Dia após dia tenho visto as tuas publicações, ali, numa outra rede social online, e admito, quase sempre com alguma vontade de te responder.

Já me conheces há muito e sabes que raramente me fico por parcas palavras. Pois não te tenho respondido precisamente por isso, porque não tenho tempo para mais. Porque não basta ter que dizer ou o que dizer.

E sabes porque não tenho tempo para mais? Porque o meu tempo tem sido ocupado a tentar fazer parte da solução. Sou um daqueles que têm contribuído, também dia após dia, para ajudar vidas, em vários sentidos. E tal como eu, e a fazer muito, muito mais que eu, há milhares de outras pessoas.

E tal como eu, há milhares de outras pessoas que se esforçam por, para além do trabalho que fazem, ainda tentar manter o ânimo dos outros, porque é preciso. E não estando em tempo de piadolas, animam-se as pessoas com a realidade, mostrando que a coisa não está a correr mal, que se está a fazer tudo o possível, e que os resultados estão à vista, e são bons resultados.

São vários os “fantásticos exemplos” de outras formas de fazer que tenho visto por aí referidos (e tu referes todos), sempre em jeito de crítica ao que por cá se tem feito, que têm caído, e caído em grande. Por aqui, em Portugal, ainda não caímos. E estou convicto de que não cairemos. Sim, por cá continuamos, sempre.

E é interessante, mesmo muito interessante, perceber que o mundo inteiro está a ver isso, a falar de nós, da forma como Portugal e os Portugueses estão a gerir o tema. E falam bem.

Mas vocês não ouvem o que não vos interessa

Na verdade, infelizmente, não é bem o mundo inteiro. Há uma pequena aldeia (que não sendo gaulesa parece gostar que assim fosse ou pensar que assim é), que continua irredutível, gritando “está tudo mal, não se faz nada de jeito neste País”.

Na aldeia do Asterix, o medo de quem lá vivia era que lhes caísse o céu na cabeça, mas viviam na crença de que nunca chegaria a véspera desse dia. Por cá, nessa vossa aldeia irredutível, o medo é o de que outras visões para além das vossas, sejam viáveis, e por isso, vivem na crença de que é no desacreditar até a exaustão que está a vossa força

Não percebem porém, que a cada reforço dessa posição que em nada ajuda, que com nada contribui, a pequena aldeia onde vivem fica mais isolada, mais fechada sobre si mesma, mais longe do mundo e da realidade. Tornam-se aos poucos, um produto de ficção, de entretenimento, uma piada que alguns referem em alusão aos “velhos do Restelo” e outros, mais a sério talvez, dizem ser só ruído, e os dias, sabes bem, não estão para ruído

A história será contada.

O COVID19 e a aldeia irredutível . Banquete do Asterix com o bardo pendurado na arvore

19. O muito antigo jogo GO tem, na sua versão mais popular, uma grelha de 19 por 19 casas.

19 anos de casados

GO é um jogo de estratégia para dois jogadores, em que essa mesma estratégia deve ter em conta um panorama global do tabuleiro, mesmo quando focados em disputas mais localizadas, e a interacção entre todas as peças, mesmo as mais distantes umas das outras.

Manter o balanço e saber gerir as diversas tensões que surgem em todo o plano de jogo é essencial, com a noção clara de que as jogadas numa ponta do tabuleiro podem influenciar as futuras jogadas na ponta oposta.

O jogador nunca pode esquecer que as decisões tomadas no inicio do jogo podem moldar situações a surgir centenas de jogadas à frente.

Outro ponto fundamental é ter a noção de que, por vezes, o jogador deve admitir algumas baixas tácticas se estas lhe conferirem uma vantagem estratégica.

Neste jogo, contrariamente a outros jogos igualmente famosos (como o Xadrez), o tabuleiro começa sem peças, há que ir preenchendo o espaço, do vazio para uma completude.

É um jogo baseado na ideia de construir. Peças individuais transformam-se em grupos e os grupos em estruturas orgânicas, fortes e flexíveis, que vivem e morrem. Com o continuar do jogo, por todo o tabuleiro, irão ocorrer transformações constantes, momentos de florescimento, momentos de decadência, derrotas e vitórias…

GO é um jogo aparentemente muito simples, mas na realidade é talvez dos mais complexos jogos alguma vez criados. Dizem alguns entendidos na matéria que o numero possível de jogadas no GO é superior ao numero de átomos observável no Universo…

Na nossa casa, há muito que o conceito de Universo deu lugar ao seu plural. Imaginem a complexidade do GO por aqui.

Amo-te, e para o ano, encontrarei uma forma ainda mais rebuscada de to dizer.

 

No Twitter, assim como em muitas outras coisas na vida, há regras a que podemos chamar “de ouro”. Uma delas é, também como em muitas outras coisas na vida, quantidade não é qualidade.

No Twitter Não te armarás em parvo

Se alguém vos disser algo como “não me queiras ensinar coisas do Twitter, eu tenho muito mais seguidores do que tu” então, estejam certos, estão perante alguém que não percebe assim tanto de Twitter. Eu diria até, perante alguém que percebe muito pouco de Twitter.

Nessa altura, podemos seguir por vários caminhos. Quem percebe esta rede social online, normalmente, opta por tentar explicar ou mostrar de alguma forma que, de entre as métricas possíveis de analisar no Twitter, o número de seguidores talvez não seja a mais relevante. E se dúvidas houver, deixemos que o próprio Twitter fale por nós:

But a following of 1 million probably does more to boost your ego than it does to deliver real value to your audience. True influence isn’t measured by how many accounts follow yours; it’s measured by engagement. And as we see organic reach on certain platforms continue to decline, it’s important to remember that simply having an abundance of followers doesn’t guarantee you can get your content to the right people.

Infelizmente, quando nos encontramos numa situação como esta, quem fez a primeira observação sobre o número de seguidores não está interessado em aprender o que quer que seja (Formação em redes sociais? para quê?) mas sim, tal qual pavão em acto de cortejo, em mostrar as suas penas. E esse é o momento certo para deixarmos que Darwin se cumpra…

A coitada da Dona Quitéria não acerta com a vocação. Depois do problema das Salsichas e da Arquitectura da Informação e dos Seguidores no Twitter, resolveu mudar de ramo. Que se lixem as mercearias – disse ela – Vou dedicar-me ao negócio das águas. Com a quantidade de gente que diz que que eu meti água aqui e ali, tenho o futuro garantido.

Já sabem como é a Dona Quitéria: quando mete uma coisa na cabeça, não descansa enquanto não meter á… quer dizer, enquanto não levar a dela avante. Assim foi.

Depois de convencido o Sr. Eduardo a mudar de negócio (“Deixe lá isso Eduardo, a fruta apodrece e água toda a gente bebe”), foi um instante até a linha de montagem estar em pleno funcionamento. Claro que não era uma água qualquer, era água premium, da melhor qualidade. E uma água da melhor qualidade tem que ser engarrafada manualmente.

Os Clientes precisam de água, a Dona Quitéria enche as garrafas et voilá, o Sr. Eduardo vende.

A Dona Quitéria não tem nada que ver com a Cindy Lauper

A Dona Quitéria não muda

Mas (porque há sempre um mas quando se trata da Dona Quitéria), havia qualquer coisa ali que não estava a funcionar como devia ser. Havia desperdício de água. Fosse a pressa da Dona Quitéria em despachar o trabalho ou mesmo a inocente vontade de dar tudo quanto podia aos Clientes, a questão é que as garrafas eram cheias até ao gargalo e, invariavelmente transbordavam. Não só se desperdiçava a água, que caia ao chão a encher, mas também aumentavam as reclamações dos Clientes, que se molhavam cada vez que abriam uma garrafa.

Inteligente que era, e já batido quer no mundo dos negócios quer nas manhas da Dona Quitéria, o Sr. Eduardo resolveu intervir e contratou o Ferdinando, que apesar de ter nome de touro animado, era conhecido na terra por saber encher garrafas (diziam por lá que era uma arte, tal a importância que se dava à água).

Ferdinando – disse uma manhã o Sr. Eduardo – sei que não conheces a nossa água mas garanto-te que é da melhor. Só precisamos que o engarrafamento seja digno da sua qualidade. Quando a Dona Quitéria te trouxer os garrafões, tu divides pelas garrafas, ela coloca-lhes a tampa e já está, produto de primeira para bem servir o Cliente.

A lição estava aprendida e, no dia seguinte, o Ferdinando lá estava, de mangas arregaçadas à espera do primeiro garrafão. Atarefada como sempre, surge a Dona Quitéria num rompante, de garrafão de 20 litros ao ombro, lançando-o com grande estrondo sobre a mesa frente ao Ferdinando. Ai está – disse ela – enche as garrafas.

Não estranhando a atitude, com um encolher de ombros de quem já encheu muita garrafa, sem mais delonga Ferdinando deitou mãos à obra e lá encheu as garrafas. Com cuidado para não entornar, e com atenção para que não enchessem até ao gargalo, deixava em todas um vazio de segurança na eventualidade do Cliente ser menos cuidadoso ao abrir as garrafas.

Vazio que estava o primeiro garrafão, o Ferdinando olhava para as garrafas, ordenadas, arrumadas dentro das grades, só esperando levarem a tampa, e orgulhosamente sorria, com a impressão de ter feito o que lhe pediram. E bem feito.

De encher garrafas percebo eu

Eis que volta a Dona Quitéria, com outro garrafão ao ombro, olha para as garrafas, para o garrafão já vazio (não fosse o trabalho ir ainda a meio) e diz “Não é assim que se enchem as garrafas”, saindo de imediato da sala deixando o novo garrafão cheio no balcão. Na falta de indicação noutro sentido, Ferdinando volta ao trabalho e esvazia o garrafão enchendo mais umas quantas garrafas. Da mesma forma que encheu as anteriores.

No regresso da Dona Quitéria, vendo que ela entrava na sala já com um ar de reprovação, Ferdinando resolveu questiona-la sobre a forma que ela entendia ser a correcta para encher as garrafas, rápido, antes que ela desaparecesse novamente.

A Dona Quitéria tira o lápis que traz ao canto da boca, coloca-o atrás da orelha (podes tirar a Dona Quitéria da Mercearia mas nunca tirarás a mercearia da Dona Quitéria), pega numa garrafa, despeja a agua para o chão e, com uma só braçada alça um garrafão cheio, virando-o sobre o gargalo da garrafa que de imediato enche até acima e ao transbordar, diz ela com satisfação “Isto é que é uma garrafa bem cheia!”.

Mas ó Dona Quitéria – dizia o Ferdinando meio perplexo – isso é fazer exactamente o que se fazia antes, da mesma maneira, com o mesmo desperdício e possivelmente, causando as mesmas reclamações. Já sem contar que o Sr. Eduardo assim paga mais um ordenado.

Pois – respondeu a Dona Quitéria – mas é assim. E para a próxima, se tiveres dúvidas, pergunta-me. De encher garrafas percebo eu.

E ao ouvir esta história pensei: há coisas que não têm sentido.*

* como ter uma fotografia do disco She’s So Unusual da Cindy Lauper (tirada enquanto tocava o Girls Just Want To Have Fun) a ilustrar este post.