Alguém me disse que tinha visto um texto meu, numa qualquer rede social, a criticar a forma como a questão da COVID19 está a ser gerida e a grande importância que lhe está a ser dada. Pedi que parasse por ali.

Não só estou certo de que a única coisa que escrevi sobre o tema foi “Portugal, a COVID19 e a pequena aldeia irredutível” (texto que dificilmente alguém poderá entender como uma critica à gestão da corrente crise) como, e sinceramente, muito mais revelador, é completamente impensável para mim negar a gigantesca importância da temática em causa.

Pedro Rebelo sobre a importância do tema COVID 19

Quem me conhece e sabe o que faço, sabe o quão interessado tenho estado no assunto, o quão próximo e o quão envolvido. Mas, quem me conhece e sabe o que faço, sabe também o quão interessado, próximo e envolvido estou na luta contra a desinformação. Infelizmente, estas duas temáticas estão muito mais interligadas do que seria desejável. E dai, haver quem veja textos afirmando categoricamente as maiores barbaridades, questionando as maiores evidências, levantando dúvidas nas mentes mais incautas, semeando a constante confusão e discórdia, aparentemente sem um real propósito.

Não, não é ser naïf, e não ver que quem escreve essas coisas o faz com segundas intenções. É, e conhecendo algumas das pessoas que escrevem tais coisas, acreditar que só pode ser sem um propósito, escrever por escrever, qual escrita fantasma de mau gosto. Porque, acredito, estas pessoas sabem que o que escrevem, mesmo nos mais recônditos cantos da Internet, ficará para sempre associado aos seus nomes.

Talvez num momento de temporária insanidade, se tenham esquecido do básico, e declararam a calma e certeza de entidades mundialmente reconhecidas como instigadores de desinformação, como fontes de verdade. Partilharam estudos de revistas conhecidas pela publicação de fraudes académicas, como verdadeiras entradas enciclopédicas, e noticias de mundialmente famosos pasquins, como vozes de arautos da verdade, enviados à Terra por não outro senão Deus nosso Senhor.

Claramente, houve leituras esquecidas pelo caminho. Desde 1882 que se anunciou a morte de Deus e, mesmo para os mais desatentos ou crentes incondicionais na certeza de que há algo eterno, será certamente claro que Deus não anunciaria a Sua palavra no Daily Mail.

Gostaria de ver o à vontade e a pose magistral de certos rabiscadores, perante uma audiência de pais, filhos e netos a quem, derivado da COVID19, faltam companhias queridas, pessoas amadas. Gostaria de os ver argumentar, munidos dos nomes pomposos de médicos estrangeiros e recortes avulso sacados de sabe-se lá onde, sem a possibilidade de bloquear respostas ou de ignorar comentários, frente a frente com alguns daqueles que entre os 60 milhões de infetados com o Corona Vírus, estiveram em camas de hospital, ligados a máquinas, sem saber se se safavam.

O mundo não é preto e branco. A sério Varatojo?

Há coisas que não entendem? Claro que há, mas perguntem a quem de direito, perguntem a quem sabe e não a quem diz que sabe porque ouviu dizer que a prima de um amigo, que tem um tio que é vizinho do irmão da filha do padrinho do primeiro casamento do cunhado de alguém que trabalha numa clínica ou lá o que é, em Cesky Krumlov, na Republica Checa, tinha lido sobre o tema no Facebook.

Mas há histórias mal contadas? Claro que há. Lembrem-se dos vossos pais. Eles contaram-vos umas quantas enquanto vocês cresceram, mas não foi razão suficiente para que vocês viessem para a Internet chamar-lhes aldrabões.

Uma amiga referiu ontem, o argumento Reductio ad Hitlerum e dai à Lei de Godwin foi um pulo (ou um tweet melhor dizendo). A aplicabilidade da mesma aqui, nem precisa de muita argumentação. Os negacionismos existem e o mais famoso de todos, independentemente das evidências, não deixa de existir.

Aqueles que negam a importância da COVID19 são também aqueles que colocam frequentemente o termo “negacionismo” em cima da mesa, num acto de auto-vitimização em jeito de defesa, argumentando que são acusados de tal por não seguirem “a corrente”, como se essa referência à priori vá impedir ou minimizar o efeito de quem os vir como aquilo que são e os chamar pelo nome.

Desiludam-se (no sentido da fenomenologia Heideggeriana, abandonando a ilusão e abraçando a realidade). Aquilo que hoje escrevem é parte do que vos define.

Que fique então muito claro: há mais Marias na terra.

Dia após dia tenho visto as tuas publicações, ali, numa outra rede social online, e admito, quase sempre com alguma vontade de te responder.

Já me conheces há muito e sabes que raramente me fico por parcas palavras. Pois não te tenho respondido precisamente por isso, porque não tenho tempo para mais. Porque não basta ter que dizer ou o que dizer.

E sabes porque não tenho tempo para mais? Porque o meu tempo tem sido ocupado a tentar fazer parte da solução. Sou um daqueles que têm contribuído, também dia após dia, para ajudar vidas, em vários sentidos. E tal como eu, e a fazer muito, muito mais que eu, há milhares de outras pessoas.

E tal como eu, há milhares de outras pessoas que se esforçam por, para além do trabalho que fazem, ainda tentar manter o ânimo dos outros, porque é preciso. E não estando em tempo de piadolas, animam-se as pessoas com a realidade, mostrando que a coisa não está a correr mal, que se está a fazer tudo o possível, e que os resultados estão à vista, e são bons resultados.

São vários os “fantásticos exemplos” de outras formas de fazer que tenho visto por aí referidos (e tu referes todos), sempre em jeito de crítica ao que por cá se tem feito, que têm caído, e caído em grande. Por aqui, em Portugal, ainda não caímos. E estou convicto de que não cairemos. Sim, por cá continuamos, sempre.

E é interessante, mesmo muito interessante, perceber que o mundo inteiro está a ver isso, a falar de nós, da forma como Portugal e os Portugueses estão a gerir o tema. E falam bem.

Mas vocês não ouvem o que não vos interessa

Na verdade, infelizmente, não é bem o mundo inteiro. Há uma pequena aldeia (que não sendo gaulesa parece gostar que assim fosse ou pensar que assim é), que continua irredutível, gritando “está tudo mal, não se faz nada de jeito neste País”.

Na aldeia do Asterix, o medo de quem lá vivia era que lhes caísse o céu na cabeça, mas viviam na crença de que nunca chegaria a véspera desse dia. Por cá, nessa vossa aldeia irredutível, o medo é o de que outras visões para além das vossas, sejam viáveis, e por isso, vivem na crença de que é no desacreditar até a exaustão que está a vossa força

Não percebem porém, que a cada reforço dessa posição que em nada ajuda, que com nada contribui, a pequena aldeia onde vivem fica mais isolada, mais fechada sobre si mesma, mais longe do mundo e da realidade. Tornam-se aos poucos, um produto de ficção, de entretenimento, uma piada que alguns referem em alusão aos “velhos do Restelo” e outros, mais a sério talvez, dizem ser só ruído, e os dias, sabes bem, não estão para ruído

A história será contada.

O COVID19 e a aldeia irredutível . Banquete do Asterix com o bardo pendurado na arvore