Eu sou uma daquelas pessoas que gosta mesmo de livros.

Quando vivia em casa dos meus pais, nunca houve da parte destes qualquer hábito de leitura (hoje, quer um quer o outro devoram livros a uma velocidade que me faz inveja. Vantagens de uma vida sem grandes preocupações… Ainda bem.) mas eu devo ter herdado da minha avó materna o gosto por ler. E como não tinha os livros em casa, desde cedo os comecei a comprar, ao meu gosto, ao meu interesse, ao meu ritmo e, ainda que com alguma disponibilidade garantida pelos pais (mesmo que não os comprassem, incentivaram-me a comprar e contribuíam obviamente com o dinheiro para tal), com a perfeita noção, principalmente a partir de certa altura, dos sacrifícios necessários para tal.

“Bebo mais um copo com os amigos logo à noite ou compro amanhã “As minha aventuras na Republica Portuguesa” do Miguel Esteves Cardoso?”

Lá fui enchendo as estantes de casa, mudei de casa, mudei de estantes, comprei estantes novas e, mais do que uma vez, tive que guardar livros em caixotes e dar-lhes o caminho da casa do sogro… Tem lá mais espaço e mais estantes. Não os mandei para casa da mãe pois as estantes que por lá havia já estavam cheias… Sim, eu gosto de livros…

Entretanto nasceu a Patrícia e eu decidi que não vão livros para mais lado nenhum. Enquanto houver um buraquinho, os livros ficam lá por casa. E porquê? Porque se e quando a Patrícia os quiser ler, já lá estão.

Mas será que a minha filha vai querer ler os livros que eu comprei?

Bem, entre “Os Três Mosqueteiros” e  a “História da Arte“, do “Moby Dick” ao “O Regresso do Cavaleiro das Trevas“, da “Mensagem” ao “O Grande Fosso“, das “Flores do mal” ao “O Refugio da Moreia“, do “Terceiro Testamento” ao “A Pele do tambor” ou ao “Wilt“, lá escolha não lhe faltará. Se os quiser ler, estão lá, são todos dela. E se continuar a tratar deles como os tem tratado até hoje, caso queira, serão também dos filhos dela.

Quando hoje compro um livro para mim, sei que o vou colocar na estante e que a partir de então, esse livro não é só meu, é nosso. E quando compro um livro para a minha filha, vejo ali não só a alegria espelhada na cara por ter recebido uma prenda mas também, o carinho com que o folheia depois e o cuidado (mesmo que por vezes descuidado) com que também ela o arruma  na estante.

Ora aqui está então o meu problema com os e-books: Como diria eu à minha filha «Folheia com cuidado, para as folhas não se soltarem…»…  E será que «Toma lá este pdf, que era do teu avô…» significará alguma coisa?

Que pensam vocês do assunto? Como vão vocês deixar os vossos e-books aos vossos filhos? Numa Flash Drive especial? Num disco multimédia partilhado na rede lá de casa? Já pensaram nisto? E a que conclusão chegaram?

10 thoughts on “O meu problema com os e-books

  1. Lembro-me que uma das minhas maiores diversões quando adolescente era ir à casa do meu pai, e roubar-lhe os livros. Foi dele que recebi o primeiro livro “de gente grande” e depois disso, nunca mais parei de ler.A biblioteca toda do meu (mesmo alguns livros muito técnicos de engenharia, estão lá guardados para quando puderem fazer a travessia atlântica de navio).

    Sempre tentei fazer com que a miúda tivesse este mesmo gosto, por isto, quando vamos ao centro comercial, lá pede ela para ir ver os livros, e sempre que possível, sai de lá com um exemplar estimulante :)
    Era um ponto que nunca havia pensado. Por enquanto tenho a colecção toda guardada para ela, mas realmente nunca tinha pensado nos e-books.

  2. Olá Flavia… A minha questão é também por ai. Não é de forma alguma um manifesto contra os e-books (e logo quem) mas sim uma verdadeira preocupação com algumas das sensações que os livros nos transmitem e que os e-books não conseguem transmitir…

    Como escrevia à pouco o Mário Lopes no Twitter, enciclopédias e manuais fazem hoje todo sentido em formato e-book mas e os outros livros? Perfeito seria que, a cada livro físico que se comprasse, fosse oferecida a versão e-book… Poder levar a colecção “Vampiro” toda para as férias do Verão… Porque não?

  3. Eu também sou defensor do “livro físico” em detrimento do digital, apesar de utilizar esse formato. Honestamente, enciclopédias, diccionários e até mesmo comics consigo conceber e utilizar em PDF mas o mesmo não se aplica aos “livros a sério”.

    No entanto, o formato digital pode ser uma excelente forma de divulgar e promover a leitura, a um custo mais baixo. Na minha opinião essa é a grande vantagem do formato digital, partindo do pressuposto que será devidamente aproveitado.

    A curto prazo o livro continuará a existir, mas com o evoluir do tempo será inevitável que se converta num luxo.

  4. Eu tenho toneladas de livros em árvores mortas, mas é um facto que desde que passei a ter livros no telemóvel (lá para 2006), passei a ler muito mais — e já lia bem mais do que a maioria dos portugueses, suponho. Mas agora, tenho livros *sempre* — coisas como estar numa fila, ir tratar de um assunto às Finanças, e assim por diante, deixaram de ser a tortura que eram. Adoro ler — e leio palavras e ideias, e não papel.

    Sim, a questão do “deixar aos filhos” existe… mas acredito que as vantagens superam as desvantagens.

  5. Nunca pensei nisso, mas uma pergunta também a fazer será : Os nossos filhos vão querer os nossos livros tal como os conhecemos e os recebemos dos nossos pais?

    Não me converti aos e-books, mas desde há alguns anos recorro muito, e cada vez mais, aos audio books.

  6. Hugo e Pedro, tal como disse antes, eu não sou contra o e-book. Tem imensas vantagens. No entanto, continuo sem perceber como gerir a parte emocional. Continuo a achar que perfeito perfeito seria, cada livro físico vir acompanhado de um livro digital. Se o Cliente assim quisesse, compraria só o digital…

  7. Concordo plenamente com a ideia do digital, até podia ser uma pequena taxa adicional para comprar a versão ebook desde que fosse algo irrisório como 20% a mais no máximo.

    Claro que o perfeito era mesmo comprar o ebook e poder pagar os portes e mais uns trocos e receber o livro físico, isso sim era perfeito.

  8. Há algo que um PDF/audio book não consegue transmitir: a sensação de passagem de testemunho, a ligação entre o antigo e o novo dono.

    Há algo no cheiro de um livro que o torna único e insubstituível :)

  9. @hugocardoso Concordo! Partilho uma grande paixão pela leitura incutida pelo meu pai. Os livros que me passou ao longo do tempo e os que deixou quando partiu são um tesouro insubstituível. Não teria com certeza o mesmo efeito se fossem PDFs.

    Nunca consegui converter-me aos e-books, embora práticos por todas as razões já referidas não proporcionam o mesmo prazer na leitura. Já os audio-books permitem-me ler sem ter as mão ocupadas e consequentemente em ocasiões em que antes não poderia ler.

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