“Nos espectáculos não há tendinites .”. Esta frase ficou comigo até ao final da exibição de A perna esquerda de Tchaikovsky, a noite passada no Teatro Camões.

Tendinites pode haver, em qualquer situação. E é por isso que Barbora Hruskova cose os elásticos das suas pontas, por fora, para tentar evitar as tendinites. Nos espectaculos, ela ata os elasticos, mas nos ensaios… Os ensaios são espaço na terra, espaço neste tempo, neste planeta (nos ensaios talvez não se atinja a perfeição e essa sim, é de outro planeta).

É enquanto fala connosco (os que estamos na Plateia) e com os seus pés, que Barbora Hruskova se reencontra consigo, com a bailarina que o ano passado anunciara a sua despedida do ballet clássico, quando interpretou pela última vez Giselle, obra seminal entre os bailados brancos onde o fantástico, a emoção, a loucura e a morte, podem servir como o quase perfeito requiem para quem abandona o palco. As tendinites, tenham elas o nome que tiverem, surgem quando menos se espera…

O seu corpo não é feito para dançar… Assim lhe diziam os pais, que não mentiam. E cujos corpos, esses sim, eram feitos para dançar. Deusas… Será essa a primeira tendinite. A primeira de muitas que uma vida frente ao espelho garante. Mas nos espectáculos não há tendinites não é?

42 anos. 42 anos em que Sonho de Uma Noite de Verão, Carmina Burana e O Lago dos Cisnes (o lindo, o sublime, o maldito Lago dos Cisnes) tanto a fez correr… A ela, uma bailarina que desde os 14 anos prometeu não mais correr… As tendinites, malvadas, podem ter muitos nomes, muitas formas.

Em palco, frente ao um espelho que desta vez não está lá, Barbora Hruskova faz uma viagem por toda a sua vida, pela vida de todas as bailarinas, levando-nos com ela, não na mala mas num bolso, ao peito, onde com a cabeça de fora, agarrando com força para não cair (tal é o ritmo por vezes), vivemos cada minuto como se fosse um momento sem tempo, como se lá estivéssemos mesmo, a cair com ela, quando uma dor na perna esquerda, uma qualquer tendinite, só nos faz querer perguntar “Porquê Tchaikovsky? Não é perfeita para ti?”

Tendinites ao piano?

Que interessa isso agora? Não é Tchaikovsky que ali está. É Mario Laginha. E se Barbora Hruskova é perfeita para Mario Laginha. Ou será que é ao contrário?

Os pianistas também sofrem com tendinites e certamente também os afinadores de pianos, mas agora não é hora de pensar nisso. O público está ali, a olhar, a sentir cada tecla, mesmo quando a força é tanta que estas parecem querer saltar, ganhar vida própria. Que par perfeito. Vê-se, sente-se em cada momento partilhado, em cada parte de um monólogo que nunca o poderá ser pois o pianista responde, provoca e quando é caso disso, quase sempre, acaricia suavemente a bailarina com a sua música, de outro planeta.

Tchaikovsky e tendinites - Pedro Rebelo

Ontem fomos ao ensaio geral de A perna esquerda de Tchaikovsky. A Susana, na sua incansável busca por ações de boa vontade, entendeu que seria uma boa altura para apresentarmos a Patrícia ao bailado. Um espectáculo solidário em que a receita do mesmo converteu a favor de algumas instituições que certamente irão fazer bom uso do que recolheram. A elas o meu muito obrigado. Aos artistas, bem, para vocês deixo-vos todas as palmas que bati. Valendo o que valem, nada mais vos poderia deixar que chegasse perto daquilo que nos deixaram a nós.

Há uns dias escrevi aqui sobre a nossa visita ao Lisboa Souk, o “Mercado Árabe” que se realizou no Castelo de São Jorge. Na altura referi o desapontamento que foi mas também referi a parte boa, a exibição de umas jovens dançarinas que durante alguns minutos encantaram os visitantes do Castelo com um espectáculo de Dança do Ventre.

Fica aqui o registo em video de uma das suas exibições:

Querem mais? Com um bocadinho de sorte ainda tenho mais um video… A ver se o encontro…




Dance Factory…, originally uploaded by Browserd (Pedro Rebelo).

"I like the way you move…"
Eu sabia que havia uma razão para o "Dance Factory" da Playstation não ser o meu jogo de eleição… Só não me lembrava que razão era essa. A Patrícia fez questão de me recordar. Saltos e pulos nunca foram a minha especialidade e em casas de soalho português, com tudo a abanar, é mais facil perceber porquê.

Há já algum tempo que não vinha do Coliseu dos Recreios com tamanha sensação de satisfação e de dinheiro bem gasto.

quebra-nozes_ColiseuA apresentação de “O Quebra-Nozes” de Tchaikovsky pela Moscow Classical Ballet (actualmente a 3ª maior companhia de dança da Rússia) foi surpreendente em todos os sentidos. Prestações exemplares em trabalho de conjunto, irrepreensíveis solistas, cenários sumptuosos e um guarda-roupa de luxo, acompanharam a partitura de Tchaikovsky ajudando a justificar o porquê desta obra ser tida como uma referência no bailado clássico.

Estreado em Dezembro de 1892, no Teatro Imperial Mariinskii de São Petersburgo, com coreografia original de Lev Ivanov e libreto de Marius Petipa, “O Quebra-Nozes” foi baseado numa história infantil de Alexandre Dumas e tem como palco a cidade alemã de Nuremberg no período natalício. Conta a história da jovem Clara, que entre as prendas de Natal recebe um quebra-nozes de aparência humana do qual gosta tanto que adormece abraçada a ele. Acorda a meio da noite com uma grande agitação no quarto: os brinquedos ganharam vida e Clara é perseguida por um exército de ratos liderado pelo seu Rei. Clara é salva pelo corajoso Quebra-Nozes, no seu sonho, um verdadeiro príncipe.

Mais tarde, e já a salvo dos ratos, Clara e o Quebra-Nozes são convidados pela Fada do Açúcar para que no seu palácio assistam a um espectáculo onde se vão sucedendo maravilhosas danças de vários países diferentes…

No final, Clara acorda e sente-se triste por tudo não passar de um sonho mas, vê depois que afinal, o seu príncipe encantado existe e não está tão longe dela quanto isso.

Uma história natalícia, para graúdos mas a que os miúdos não ficam indiferentes.