Foi há muitos, muitos anos atrás, numa daquelas alturas da vida em que tudo parece correr mal, quando entre angustias adolescentes e rebeldias que se pensam próprias da idade, uma amiga me ofereceu o Requiem de Antonio Tabucchi.

Veio do nada, apareceu ao fim da tarde naquela esplanada manhosa onde as pernas enferrujadas da mesa branca começavam já a enterrar-se na areia da margem do rio. Uma garrafa de Porto branco já meio vazia turvava a vista da Lisboa que estava ali, no outro lado.

Já não me lembro da conversa (ou do silêncio talvez) mas certamente terá acabado comigo a embarcar, sozinho, numa daquelas viagens que se fazem para que a hora não chegue, aproveitando a magia que o embalo das ondas calmas me fazia sentir… Ir e voltar. O Requiem foi comigo.

A Lisboa de Tabucchi

Poucas páginas viradas e o sentido tinha agora lugar. O narrador era eu, porque não? Alucinações eram lugar comum na altura e tal como sobre mim, também sobre ele pairava um fantasma… E tal como ele, e o dito fantasma, também eu amava a cidade branca.

Li e voltei a ler Requiem. Em Lisboa fiz da alucinação verdade e vi a verdade muitas vezes parecer pura alucinação, mas Antonio Tabucchi já me tinha preparado. Para os taxistas, os empregados de bar, para os taberneiros, as senhoras da praça e as outras, de outras vidas. Todos que passam ou vão ficando. Por Lisboa.

A cidade é desde então uma outra cidade. É deles (vês fantasma? Não me esqueço de ti Pessoa.) certamente mas é minha também, é nossa de uma forma muito especial. Obrigado Antonio Tabucchi.

Eu sei, eu sei… Devia estar a dar a volta ao Tom Gunning e ao seu espanto, ao Freud e ao seu… Vá lá, como traduzir uncanny? Ou ao Nadar, ao Heidegger ou ao Agamben… Pois. Devia.

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De alguma forma, de alguma estranha forma, acho ainda assim que Bataille tem também a sua razão de ser aqui no meio de tudo isto… Não sei se o Professor José Bragança de Miranda concordaria mas quase arrisco a dizer que sim. Afinal, é de terror e êxtase que se fala…

Sim, sim, eu sei… Mas no exame não será de Bataille que se vai falar…

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Eu não devia. A sério, não devia. E nem é pelo Strange Case of Dr. Jekyll and Mr. Hyde que devia já sabido na ponta da lingua (do livro a três das suas tentativas de adaptação cinematografica) nem pelo Agamben ou o Heidegger que me deviam estar a fazer companhia há meses… Nada disso. Não devia por uma questão de amor próprio, por achar que há tanta outra coisa boa sobre o tema. Não devia porque já está feito. Não devia porque está bem feito…

Estou a ler porque… Bem, vamos ver se consigo fazer melhor…