Despacito será talvez a música do ano. Menos mal. Podia ser Felices Los 4.
Nunca tinha ouvido Felices Los 4, nunca tão pouco tinha ouvido falar de Maluma. E eis senão quando, um pouco antes ou um pouco depois de Luis Fonsi e Daddy Yankee terem dado um ar de sua graça na estação de rádio que tocava, surge o verso:
Si conmigo te quedas
O con otro tú te vas
No me importa un carajo
Porque sé que volverás
Espera… Como diz que disse? Então e o Despacito? Já se foi?
Percebendo o artista certamente que tal pérola não seria de fácil entendimento à primeira, repete logo de seguida, para que dúvidas não restem. Ainda não estava completamente convencido do que ouvia, quando surge nova estrofe, para arrumar de vez com a conversa:
Y si con otro pasas el rato
Vamo’ a ser feliz, vamo’ a ser feliz
Felices los 4
Te agrandamos el cuarto
Despacito? Volta, estás perdoado.
E é este o momento em que recordo o Despacito. “Tú, tú eres el imán y yo soy el metal…”? Sim, claro. Porque não?
Firmo en las paredes de tu laberinto
Y hacer de tu cuerpo todo un manuscrito
Venha de lá isso então. Poesia da boa. E digo-o sem qualquer ironia (já “há, nos olhos meus, ironias e cansaços” que bastem).
Ainda me pergunto se entre os milhares (milhões) de almas que cantarolam isto de manhã à noite, haverá quem pense no que está a cantarolar. E logo de seguida recordo American Pie quando Don McLean cantava “And we sang dirges in the dark, The day the music died…”
Sim, American Pie, também ela tantas vezes cantarolada, bem e mal tratada mas, diacho, lembram-se da letra? Foram precisas 16 páginas de rascunhos (16 páginas a valerem qualquer coisa como 1.2 Milhões de dólares) para chegar até ao que conhecemos hoje como uma das mais enigmáticas peças da musica popular norte-americana. Deusas, a diferença…
Uma canção que nos fala sobre três décadas da história norte-americana, da história da civilização pelo que nos concerne. Três décadas, uma eternidade, numa só música. Uma música que nos leva da morte de Buddy Hooly ao concerto dos Rolling Stones em Altamond, passando pelo Elvis, pelos Beatles, pelo Dylan, e Seegler, Baez, Joplin…
Leiam o artigo que Yeoman Lowbrow escreveu há uns dias na Flashback, The Day the Music Died: A Closer Look at the Lyrics of “American Pie” e depois pensem novamente no Despacito. E na outra que já não me lembro o nome… Lembrem-se também que, tanto a umas como a outras, chamam de música popular…
Já dizia o Rui Reininho “Faz-me impressão e baralho…” mas isso fica para outro dia.